quarta-feira, 23 de março de 2011

3º Domingo Quaresma – Ano A – 27/03/2011



Evangelho: Jo 4,5-15.19b-26.39a.40-42

Jesus  e  a  sede  da  humanidade:
a.  ao redor do poço   -  vv.  5-6
b.  quebrando o preconceito racial   -  vv.7-15
c.  quebrando o preconceito religioso   -  vv.16-26
d.  o  anúncio  que  leva  à  fé   -  vv. 27-42
a. ao  redor  do  poço   – vv. 5-6
1.   Tudo começa  ao redor do poço  com o encontro de Jesus  com uma  mulher samaritana.  Os samaritanos surgem em 722 a.C. (cf. 2Rs 17,24-41). Formaram-se  da  misci-genação  de  israelitas  com  cinco povos estrangeiros  e  seus  cinco deuses.  E este é o motivo do ódio dos judeus para com o samaritanos.  Os samaritanos haviam construído um templo no monte Garizim  como rival do templo de Jerusalém  (João Hircano havia des-truído  esse  templo em  129  a.C.)
2.   O poço  recorda muitos fatos do AT, entre eles:
- o servo de Abraão  encontra Rebeca, futura esposa de Isaac (Gn 24, 13ss);
- Jacó encontra  sua futura esposa  Raquel  (Gn 29,1-14);
- e  Moisés encontra Séfora com quem se casou (Ex 2,16-21).
Não se pode esquecer  o que significavam  os poços  para  aqueles  pastores  que viviam semi-nômades (cf. Gn 26).   O  Gênesis  não  menciona  esse poço;  mas  se  Jacó  comprou um terreno (Gn 33,19; 48,22; Js 24,32)   podemos  deduzir  que  estava  provido  de  um  manancial.  Os dois dados,  poço e patriarca,   são  funcionais  no  relato.
3.   O poço de Sicar  é, pois, o lugar onde a  humanidade se encontra com  seu  esposo  e líder.  As personagens  acima  aproximaram-se do poço  à tarde,  e  quem tinha sede eram os animais.  O episódio de  Sicar  se  dá  ao  meio-dia  e  quem  tem  sede  é  Jesus.  No evangelho de João   o  meio-dia  recorda  a Hora de Jesus,  a sua crucifixão, onde ele declara  ter  sede (Jo 19,28).
4.   Para o povo da Bíblia,  o poço  é  símbolo da  Lei,  das instituições judaicas  e da sabedoria.  Sentando sobre  o  poço,  Jesus  se  dá  a  conhecer  como  fonte  da  qual  a humanidade inteira  bebe.  A partir  de agora  não  se deve mais  beber  água  da  Lei  ou das instituições,  porque foram superadas  pela fonte de água viva  que é Jesus.
5.   Uma  mulher  sem  nome  se  aproxima  -  ao  meio-dia  -   para  buscar  água. Ela não tem nome  porque  é  a própria humanidade  que,  no  sufoco  do  calor,  procura algo  que  sacie  de uma vez por todas  a  sua  sede  (lembremos  as primeiras palavras  de Jesus em João 1,38: “o que vocês estão procurando?”).
b. quebrando  o  preconceito  racial   – vv. 7-15
6.   Jesus sente o que é comum a todo ser humano  e  pede de beber.  Com isso começa a quebrar o preconceito racial.  Judeus e samaritanos se odiavam mutuamente.  Judeus mais radicais haviam decretado o estado permanente de impureza das  mulheres samari-tanas.  Então,  o gesto de Jesus  parece insano: pedir a uma mulher  que lhe dê de beber.  Jesus  estava  quebrando  a inimizade entre judeus e samaritanos,  quebrando  a pretensa superioridade  dos judeus  e  a  pretensa  superioridade  dos  homens  sobre as mulheres.
Dar  água  é  a  mesma  coisa  que  acolher,  dar  hospedagem  (normalmente  os  samaritanos  negavam água aos judeus).
7.   Jesus está com sede,  mas  quem acaba pedindo água  é  a  mulher, pois ele tem água capaz  de saciar para sempre  a  sede de todos:  “se  você conhecesse o dom de Deus  e  quem  é  que está dizendo  a você:  dê-me  de  beber,  você  é  que   lhe  pediria,  e  ele lhe  daria  água  viva…  Aquele  que beber da  água que eu vou dar, esse nunca mais terá sede” (vv.10.14a).  Jesus  é  o presente  de  Deus  que a humanidade precisa conhecer.  Os judeus  acreditavam  se  aproximar  de  Deus  mediante  o conhecimento  e  a  prática da Lei.   Jesus  é  aquele  que  revela  o  Pai,  mostra-o presente nas relações de fraternidade e  gratuidade.
8.   Quem beber desta água …. (vv.13-14).  Jesus revela o sentido simbólico das suas palavras,  a sua interpretação da água,  de acordo com a tradição bíblica: “eles me aban-donaram, a fonte de água viva”;   “pois em ti está  a fonte  viva”;    “com alegria  tirareis água das fontes da salvação” (Jr 2,13; Sl36,10; Is 12,3).    A água  do poço  mata a sede  cada vez  que se bebe,  e  se torna a beber.   A  água  de  Jesus  sacia  a  sede  definitivamente porque  se torna  manancial  dentro da pessoa,  que  brota perpetuamente  ou  que comu-nica  uma vida imortal.  A  água de Jesus  pode ser  sua revelação  ou  o dom do Espírito (Jo 7,37-38)
9.   A água  que Jesus dá  é  o  Espírito,  a força  que vem de dentro  e  jorra para  a  vida eterna.    A  mulher-humanidade  tem  sede  dessa  água,  e  por isso  pede: “Senhor, dá-me dessa água,  para que  eu  não  tenha  mais  sede  e  nem  tenha  de  vir  mais  aqui para  tirar”(v.15).
c. quebrando  o  preconceito  religioso   – vv. 16-26

10. A samaritana  não tem  nome,  mas certamente vários  nomes  lhe  foram  impostos por  ter tido  cinco  maridos  e  conviver com o sexto  e  apesar disso,  continua  com sede  da  água  que  só  Jesus,  esposo-da-humanidade,  pode dar.  Os cinco maridos  po-dem  ser tomados  simbolicamente  (cinco divindades: cf. 2Rs 17,29-41) )   e  o  sexto  seria  o próprio  Javé  transformado  em  ídolo  (cf. Ex 32  e linguagem simbólica de  Oséias: 8,5s;10,5s ).   Assim se entra no assunto religioso.
11.   Os samaritanos  aguardavam  um messias  (chamado  Taeb) diferente do esperado pelos  judeus.  Assim  temos, além do preconceito racial,  também o religioso.  Jesus acaba  com  esses  preconceitos,  mostrando que  a  época dos templos  chegou  ao  fim, pois  ele  é  o  novo  santuário  de onde  brota  o  Espírito fiel:  “está  chegando a hora,  e  é  agora,  em que  os verdadeiros adoradores  vão adorar  o  Pai  em  espírito  e  verdade.  E, de fato,  estes são os adoradores que o Pai procura” (v. 23).
d. o  anúncio  que  leva  à  fé   – vv. 27-42
12.   Os discípulos de Jesus continuavam presos à mentalidade judaica que discriminava pela   raça,  sexo  e  religião.  O verdadeiro discípulo  – início da comunidade-esposa de Jesus Messias -  é  a  samaritana  que,  -  depois de  abandonar o balde, -  anuncia  aos habitantes da cidade seu encontro com um homem,  levando as pessoas  a  conhecê-lo.
13.   O diálogo com os discípulos (vv.31-38)  mostra que  o  alimento  de Jesus,  sua  nova lei,  é  levar  a  termo  a  criação  do  Pai,  restabelecendo  a harmonia  perdida pela  auto-suficiência  humana.  Jesus  é,  ao mesmo  tempo,  o  semeador  do  projeto  do  Pai e  o  trigo  a  ser  semeado.
14.   A experiência da mulher  conduziu  as pessoas  a Jesus  e  fez deste  o  hóspede dos samaritanos (ficou lá dois dias).   Agora,  porém,  eles  não  precisam  mais  do  testemunho dela,  pois  sabem  que  Jesus  é  realmente  o  salvador do mundo  (v. 42).

1ª.  Leitura:     Ex    17,  3 – 7

15.   O povo de Israel  realiza,  na caminhada pelo deserto,   um  processo de  libertação da  escravidão do Egito. O  tempo  passa,  as  dificuldades  aumentam.   O  entusi-asmo dos primeiros momentos do êxodo   dá lugar   às  reclamações.  Aparece   a  tenta-ção do desânimo e  do desejo de voltar ao regime anterior.  De fato,  a água é elemento essencial para a sobrevivência do povo.  Como não reclamar … ?
16.   Vendo num nível superficial  o texto  parece  querer  explicar  a origem dos lugares chamados  Massa e  Meriba.     Na língua hebraica  significam:  Massa = provocação  e  Meriba = contestação.  Tentou-se ligar os termos  a uma situação difícil de falta de água durante a caminhada  em direção à Terra Prometida.   Mas  vendo  num  nível  mais pro-fundo, o  texto  lê  os  acontecimentos  à  luz  da  fé no Deus libertador,  aliado  do povo no  processo  de  conquista  da liberdade  e  da vida.
17.   O deserto é a  etapa  intermediária    entre  a casa da servidão (Egito)  e  a casa  da liberdade (Terra Prometida). Só  na Terra  Prometida  é que  irá correr  leite  e  mel.  A  falta d’água  revela  que  o povo  não  entendeu  e  não  assumiu  todo  o processo  de libertação  em sua complexidade.    O povo reclama contra Moisés  preferindo ter ficado no Egito escravo  a  enfrentar  a precariedade  do caminho  pelo deserto (vv.3-4).
18.   O povo está prestes a cometer a maior idolatria:  abandonar  o  Deus da Vida  para voltar  a  servir  aos Ídolos   que  sustentavam  um   regime  de  Morte vigente  no Egito.  O povo  quer voltar  a um   sistema político opressor   ao invés de   lutar  por  um projeto  novo  de  liberdade  e  vida.   Não querem suportar as dificuldades do momento, a precariedade  dos meios que tem à disposição  no deserto. Preferem  ser  escravos, desde  que  tenham  comida  e  água.
19.   Onde  ficou  a fidelidade  do povo,  o compromisso  com  aquele  Deus  que  os  libertou  do Egito  e  os acompanhava pelo deserto?  Por  pouca coisa  e  por  pouco tempo,  o  povo  renuncia  à  toda   promessa  de  Deus.   Mas apesar da  inconstância do povo  no processo de libertação, Deus continua  fiel  ao  seu  projeto, e  faz jorrar  água da  rocha (vv.5-6).  Javé  é  fiel,  é  aquele que caminha à frente, dando segurança e apoio (v.6),  por isso, em outros textos do  AT  ele  é  chamado  de  Rocha  (Sl 18,3:  “Javé é minha rocha  e  minha fortaleza,  quem me liberta  é o meu Deus.  Nele me abrigo,  meu Rochedo,  meu escudo e minha força salvadora, minha torre forte e meu refúgio”.    Outra  versão  deste salmo de  Davi,   libertado dos seus inimigos,   está  em 2 Sm 22;  cf. Gn 49,24;  Dt 32,4.15.18.37;  2Sm 22, 3.31-32.47).
20.   O  NT  leu  esse texto  à luz do  acontecimento  pascal.  Jesus  dá  à  humanidade  a água  que  sacia  a  sede:  “se alguém tem sede   venha a mim,  aquele que acredita em mim,  beba… (Jo 7,37-38).   Moisés  golpeou  a rocha  e  dela saiu  água  para  o  povo;  o  soldado atravessou o lado de Jesus,  e  imediatamente saiu  sangue e água (Jo 19,34).
21.   Uma  lenda judaica  conta  que  a  rocha  seguiu  os  israelitas  por  toda  a  viagem. Paulo alude a ela  em   1Cor 10,4:  “…  e todos beberam a mesma bebida espiritual; pois bebiam da rocha  espiritual que os seguia, rocha que é o Messias”.

2ª.  Leitura:     Rm   5, 1-2 . 5-8

22.   Cristo  morreu  por  nós  quando  ainda  éramos  pecadores. Paulo  afirma  que  a humanidade  não  pode  se salvar por própria conta. Mas  Deus salva a humanidade (=justifica-a) com uma condição:  que ela  creia  em  Jesus Cristo,  que  trouxe  o  projeto do  Pai.   Crer  é  aceitar  Jesus  e  comprometer-se  com  ele.
23.   A  morte e ressurreição de Jesus  são  a  anistia que Deus concedeu à humanidade: “agora  que  fomos justificados  por  Deus  por meio da  fé,  estamos  em  paz  com Deus  por  nosso Senhor Jesus Cristo” (v.1).
24.   Jesus  restabeleceu  a aliança  entre Deus e seu povo,  não  por  causa  dos  méritos das pessoas  -  mas  por ação  do Deus fiel. De fato, Paulo pensa;  se nós fossemos justos,  não precisaríamos  de alguém  que morresse por nós;    se  fossemos  pessoas  de bem,  talvez.  Fato é  que  Cristo  morreu  por  nós  quando ainda  estávamos  sem força, ímpios  e  pecadores (vv.6-8),   e   isso  só  ressalta  a  força  da  graça  de  Deus.
25.   E  a grande  descoberta  de Paulo (que faz sucumbir  o Paulo fariseu,  e  faz nascer o  Paulo cristão)   é  a   certeza  da  graça  de  Deus: Cristo  morreu  por  nós  quando  ainda éramos  pecadores.  Esse dado  anima  a  esperança  dos cristãos  em meio aos conflitos, na certeza de alcançar a glória  de Deus (v.2).    Os discípulos de Jesus  caminham  na  fé para  a esperança  na salvação definitiva,   apesar de não terem  superado ainda  todas as alienações,  das quais  a  morte  é  a  expressão  última.   Caminham  sob  o  impulso  da Trindade,  pois  o  Pai justificou  a humanidade  por meio  do  Filho,  que  nos  tirou da alienação  e  nos  concedeu  o  Espírito Santo,  a fim de que  possamos  pôr em prática o projeto divino.
26.   Reconciliados com Deus  pela fé,  entramos numa situação de paz e esperança: paz que  supera  a  tribulação,  esperança  que  transforma  o presente.   Desfrutamos da  “graça”  ou  “favor de Deus”  e  de  seu  “amor”   revelado  no  sacrifício  de  seu  Filho. Agora  pomos  “nosso orgulho”   não  em  méritos  de  obras,    mas  na  esperança  (v.2),  nas  tribulações  que  a  robustecem (v.3),    em  Deus mesmo  (v.11).   Tudo  por  meio  de  Jesus  Cristo  (5,2.9.11.17.21).
27.   A esperança  brota e se sustenta  do amor que Deus nos tem e  que o Espírito Santo nos  faz  experimentar  em  nossa  consciência.   Ao  reconhecermos  internamente, pelo toque do Espírito,  que  Deus  nos  ama,   nossa  esperança  se  sente  segura:   pois, aquele que  nos ama  não pode frustrar-nos (Sl 22,6; Eclo 2,10).
28.   A morte de Cristo  é  antes  de  tudo  revelação  do  amor  incondicional  de  Deus: um  amor  não suscitado  por nossa boa conduta;  muito pelo contrário.  Não  pode-mos  estar orgulhosos  de nós:  todo o nosso orgulho  reside  em  Deus,  orgulhosos  não do  seu  poder (Sl 115,3)  mas  do  seu  amor.
- No fundo escutamos  o texto de  Is 53:  “não tinha beleza…  era desprezado  e abandonado pelos homens…  desprezado…  mas  eram nossas enfermidades que carregava…  nos o tínhamos como vítima de castigo…  foi trespassado por causa  das nossas transgressões…   esmagado pelas  nossas iniqüidades…    visto que entregou  sua  alma  à  morte,    foi  contado  com  os  transgressores,    mas  na  verdade levou  sobre  si  o  pecado  de  muitos   e   pelos  transgressores  fez   intercessão”.
- Lembramos  também 1 Jo 4,10: “nisto  consiste  o amor:  não fomos  nós  que  amamos  a Deus,    mas  foi  ele  quem  nos  amou   e  enviou-nos  o seu  Filho  como  vítima  de  expiação  pelos  nossos  pecados”.
29. “E  a  esperança  não  decepciona, porque  o  amor  de  Deus foi  derramado  em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (v.5).

R e f l e t i n d o   . . .

1.   A  água  é  tão  vital  que sua escassez  pode provocar  uma guerra mundial.   Sem água  não  há  vida. Quando os hebreus,  no deserto,  desafiaram  Deus  exigindo água,  Deus lhes deu água física (1ª. leitura).  No evangelho Jesus conscientiza a mulher samaritana  que  sua  sede  é  bem  mais  profunda,   não por água material,  mas  por  “espírito e verdade”.
2.   Esta  sede  é  aliviada  pelo dom  de Jesus Cristo.  Ele é a  “água viva”,  que acaba definitivamente com a sede  e  faz o mundo  viver  para Deus.   Paulo na 2ª. leitura evoca  o simbolismo da água  para  falar  do   “amor de Deus,  derramado  em nossos corações  pelo  Espírito Santo  que nos foi dado”. O  batismo  é  a  efusão do Espírito sobre os fiéis.
3.   Esse  dom de Deus  é  gratuito. Os hebreus,  no deserto,  desconfiaram de Deus e acharam  que deviam desafiá-lo.   Mas  o dom do Espírito,  trazido  por Cristo,  que dá  sua vida  por nós,  é  pura graça. Nem sequer conseguimos pedi-lo como convém, porque ultrapassa o que pedimos. Por isso,  devemos deixar Deus  converter e  educar o nosso desejo,  para que nosso desejo material  nos leve ao desejo da vida no Espírito.
4.   Por outro lado, a  consciência  do dom  espiritual (=divino)   não  leva  a  desprezar o desejo  material  justo  daqueles  que  realmente  estão  necessitados.     O  desejo fundamental  conforme  a vontade de Deus  orienta  também  a  busca  dos  bens  ma-teriais  necessários  e  sua  justa  distribuição.
5.   Precisamos  de  verdadeira  “educação  do desejo”. Nossa sociedade consumista não  “cultiva”  o  desejo,  mas  simplesmente  exacerba-o  e o torna desenfreado …  Em vez disso,  devemos  aprofundar nosso desejo, para que  ele reconheça a sua me-ta  verdadeira:  a  “água viva”, “Cristo, o dom de Deus” na  comunhão  com  os nossos irmãos…   O desejo  da água natural  significa  o desejo  de viver.     Aliviada a sede,  o desejo continua.  Qual é o seu fim?    O desejo não é  pecado:  é bom,  é vital, mas deve ser orientado,  através das criaturas,  para  seu  verdadeiro  fim,  o  Criador.
6.   A  Quaresma é, na tradição da Igreja, o tempo da preparação para o batismo. Para nós  batizados  deve ser  tempo  de renovação  e  aprofundamento do  nosso com-promisso  batismal.   “Re-passar”  com Cristo,  re-fazer  a  passagem  pela  água  para purificar-nos novamente de tudo o que  foi se acumulando  e grudando em nós duran-te  o ano  e  que  não ajuda  na construção do Reino.  É tempo de limpeza, de purifica-ção,  de tirar os excessos,  de despir-nos do “homem velho”,   de tudo  o que  é velho  e inútil  na nossa vida,  de tudo  o que  não leva  a Cristo,  de tudo  o que  não constrói o Reino,  de  tudo  o  que  não  constrói  a  nossa  vida  para  a  eternidade.
7.   A água do batismo  significa  uma realidade invisível,  aponta para   a satisfação do nosso grande desejo: a  vida  que  Cristo  nos  dá,  o  Espírito  de  Deus,  derrama-do  em  nossos  corações. A  educação de nosso desejo  pode ser  a  preparação  do nosso compromisso batismal  na noite da vigília pascal.  E  a  melhor  pedagogia  para isso  é:   começar   a  não  satisfazer   qualquer   desejo  mesquinho  e  egoísta, mas concentrar  nossa vida  em torno do  desejo profundo  -  material e espiritual  -  de  nós mesmos e dos nossos irmãos.
8.   A liturgia de hoje  focaliza a água  no sentido simbólico  que se apresenta no batismo.   Significa  o dom de Deus,  que é Jesus mesmo.   E como nos diz a 2ª. leitura, esse  dom  de  Deus  é  gratuito:  seu representante,  seu Filho,  deu  sua vida  por nós enquanto éramos seus inimigos!    Receber  essa  água, (no batismo ou na sua renovação na vigília pascal),     é  deixar-nos  envolver  com  esse   amor  gratuito  de  Deus   em  Jesus Cristoé  comprometer-nos  com  essa  imensurável  bondade  do  nosso  Deus.   Isso só  é  possível  porque  Deus  amou  primeiro! (1Jo 4,10).
9.   A grande  novidade de Jesus  é  a proposta de  total mudança de mentalidade com relação  a Deus:  ele  o  chama  de  Pai. E,  como  Pai  de  todos,  não  necessita de determinado lugar para ser cultuado,  nem na Samaria nem em Jerusalém.
9.1.  A  mudança de mentalidade também significa  entrar  numa  nova  relação  com o próximo,  a  qual  derruba  as  barreiras  entre  judeus  e  samaritanos. Ambos poderão  adorar  a Deus  já  não mais  com  rituais  fixados  pela  rigidez legalista, mas em   “espírito  e  verdade”.
9.2.  Sendo  Deus  a  fonte  de  todo  amor  e  de toda a  vida,  Pai de todos  os  povos, deseja ser adorado de modo verdadeiro em todos os lugares.  Ele busca pessoas que  o  adorem  com  lealdade.   Jesus, o Filho,  viveu  o amor  desta maneira: na fidelidade ao Pai,  deixando-se conduzir  pelo Espírito  da  Verdade.   Do  coração de  todos  os  que  seguem  Jesus  brotam  rios de  água viva,  pois  sabem  amar como  Jesus  amou.

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